O secretário de Meio
Ambiente de São Sebastião diz que esta é a hora do Estado intervir; a região
teme que a gestão de recursos hídricos siga o mesmo caminho do Sistema da
Cantareira
Mapeamento aponta duas bacias hidrográficas do litoral como em “estado crítico” |
A falta de planejamento estratégico na gestão de recursos
hídricos traz seus primeiros resultados negativos para o Litoral Norte de São
Paulo. As bacias dos rios São Francisco e Maresias, em São Sebastião, já se
encontram em estado crítico. Isso porque, segundo dados revelados pelo Comitê
de Bacias Hidrográficas do Litoral Norte (CBH-LN), divulgado em setembro,
existe mais consumo de água do que está disponível.
O mapeamento, conhecido por Q7-10, toma como base os sete
dias mais secos dos últimos 10 anos, e calcula a rapidez com que atualmente o
volume de água escoa por seu leito para definir qual será sua vazão.
Para concluir esta análise, ainda foi preciso saber qual o
limite máximo de outorgas – direito de uso de recursos hídricos – destas bacias.
No caso do Rio São Francisco esse limite é de 50%. Para permitir o uso de
recursos hídricos o Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) utiliza
como parâmetro o cálculo Q7-10.
De acordo com os dados obtidos, o direito de uso de água do
São Francisco está alcançando os 120%, o que demonstra o risco sobre os
mananciais. “Este estudo propõe o planejamento para soluções de racionamento,
antes que estes problemas venham acontecer. É um alerta”, falou o secretário
executivo adjunto do CBH-LN, Fabio Pincinato.
O secretário de Meio Ambiente de São Sebastião, Eduardo
Hipólito do Rego, prevê “grandes” problemas nesta temporada. “O regime hídrico aguardado, talvez não
consiga regularizar os mananciais. Este é o momento do Estado reconhecer que
ele precisa fazer um racionamento de água”, afirma.
O engenheiro florestal Juliano Hojah, que atua em um projeto
para recuperação destas bacias, explica que alguns afluentes do Rio São
Francisco podem desaparecer se não forem adotadas melhorias. “A vida de algumas
espécies de seres vivos, que dependem destes rios para sobreviver, estará
comprometida”, lamenta.
Rios e afluente no bairro São Franciso, em São
Sebastião, correm o risco de desaparecer - Foto: Juliano Hojah |
Para o responsável pelo centro de gerenciamento de recursos
hídricos do DAEE, Cesar Galdino, o estado crítico destas bacias implica em não
fazer mais liberações de outorgas para os pontos de captação de água destas
bacias.
Galdino conta que apesar dos investimentos da Companhia de
Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), a concessionária precisa
fazer a medição da vazão também nos mananciais, e não apenas no que é tratado.
“No passado já tivemos problemas na região, onde alguns rios chegaram a secar
por um curto espaço tempo”, alerta.
Em nota, a Sabesp informou que o manancial do Rio São
Francisco representa apenas 5% de toda água distribuída na região e que a
contribuição ocorre de maneira complementar, geralmente em período de
temporada.
A empresa destacou que a monitoria é realizada com inspeções
periódicas junto a este corpo d’água, que tem algumas centenas de metros de
extensão. Lembrou ainda que se trata de um manancial preservado - sua nascente
está na Serra do Mar e sua foz no próprio mar junto à praia de São Francisco.
Ainda segundo a Sabesp, o manancial não possui afluentes e depende unicamente
das chuvas para existir.
Captação irregular de água é um dos fatores que
preocupa região Foto: Juliano Hojah |
Captação irregular e
temporada
O estado crítico de bacias do Litoral Norte chegou ao Poder
Legislativo de São Sebastião. Com receio dos visitantes que frequentarão a
região na temporada, o vereador José Reis (PSB) emitiu um requerimento à Sabesp
para que ela se posicione sobre o cenário hídrico na região.
“O que escutamos hoje
é que o paulistano está saindo de São Paulo, no final de semana, porque não tem
água. Queremos que a Sabesp nos dê uma posição para que não cheguemos a um caos
na temporada e para sabermos quanto temos de água para consumir em São
Sebastião”, acrescentou o vereador.
Em seu documento, o parlamentar cita a preocupação com o
longo período de seca e temperaturas elevadas que resultaram na maior crise de
abastecimento enfrentada pelo Estado de São Paulo com a queda acentuada do
nível do Sistema Cantareira, responsável pelo abastecimento de 6,5 milhões de
pessoas na Grande São Paulo, além de problemas em várias cidades do Interior.
Em 10 anos a população local cresceu 17,45%, em relação a
2004, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), alcançando mais de 310 mil moradores. No verão, a população no litoral
norte paulista pode triplicar com a chegada dos turistas, ultrapassando 1
milhão de pessoas, segundo as prefeituras, o que reflete no aumento do consumo
de água, que pode agravar a situação.
Além do alto consumo de água no litoral norte de São Paulo,
outro fator colabora para o estado crítico das bacias dos rios São Francisco e
Maresias: a captação irregular de água. O problema é que não se trata apenas de
um crime ambiental, mas também da possibilidade de prejudicar ainda mais a
distribuição de água em São Sebastião.
O gerente operacional da Sabesp, Pedro Fernandes Ponce,
declara que a captação irregular atinge cerca de 60% da população atendida pela
Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo. “Há locais onde as
pessoas estão captando muita água, mais do que a Sabesp. É um assunto polêmico
e complexo”, afirma.
A representante regional da Associação Brasileira de
Engenharia Sanitária, Denise Formaggia, disse que a captação irregular de água
é um caso, inclusive, de saúde pública. “As pessoas que decidem fazer sua
própria captação e evitam o tratamento adequado da água, correm o risco de
contrair doenças, como a diarreia”, concluiu.
Bairro São Francisco, em São Sebastião, possui a bacia hidrográfica mais crítica do Litoral Norte de São Paulo. Foto: Divulgação |
Na temporada o consumo de água aumenta significativamente e pode agravar a
situação dos recursos hídricos do Litoral Norte de São Paulo. Foto: Gianni D’Angelo
|